Estava escuro, a luz da entrada não
atingia o local, mas não precisou tatear muito até achar a vidraça quebrada.
Com o apoio de uma lata, alcançou a
altura necessária para efetuar a invasão. Muito cuidado agora, qualquer pressa poderia
lhe causar cortes tremendos por todo o corpo. Foi se enfiando no buraco aos
poucos, milímetro por milímetro, o fôlego praticamente suspenso, as mãozinhas magras
no parapeito interno da janela, providenciando equilíbrio. Só precisava de
calma, a calma que tivera até então, bastava torcer o quadril uns centímetros
para a esquerda, talvez encostando-o na lâmina afiada do vidro, até que sua
perna direita também começasse a entrar.
A operação deu errado, porém. De tão
lento que ia, talvez, a mão escorregou e ele desabou para dentro da casa. Só
quando atingiu o assoalho úmido, assim meio de lado, amortecendo a queda com os
braços e o beiral da testa - o zoadão de vidros e madeiras terminando - é que
sentiu a dor aguda e incisiva nas costas.
__Me cortei, droga, me cortei...
Passou a mão na perna, devagar, e a
sentiu molhada, absolutamente molhada. “Tá sangrando pra valer” concluiu. Precisava
pegar os salames, os biscoitos, os pães, tudo enfim que pudesse carregar, e dar
o fora de uma vez.
Definitivamente não havia mais ninguém
naquela casa, nem velhos, nem feiticeiros, nem fantasmas.
A porta do quartinho estava destrancada.
Beleza! Dinho respirou fundo, conseguiu controlar a dor, tirou o “saco de
compras” do bolso e, pé ante pé, procurou o interior do casarão.
...
No extremo oposto da claridade que se findava
num cone, viu algo realmente estranho. Um sapo surgiu das trevas e colocou-se a
postos, como um cão de guarda, encarando-o com seus olhos amendoados e
fosforescentes. Talvez fosse o sapo que o velho capturava no outro dia, no
ponto de ônibus. Por um segundo, Dinho pensou em retornar, mas isso não tinha
sentido, aquele animalzinho feio não poderia lhe causar mal nenhum. Avançou
mais dois passos, o sapo na mesma postura. Então, da parte escura da sala,
começaram a surgir diversos ruídos secos, sem eco, como se bolas murchas
caíssem e ficassem coladas no chão. O sapo, na frente de Dinho, continuava de
guarda, em cada olho uma lanterna.
Quando o garoto finalmente resolve
desistir e se virar para correr, as luzes se acendem.
Na sua frente está o dono da casa, o
velho, só que agora mais pálido, os olhos bem mais vermelhos, o nariz
redobradamente afilado e adunco. O menino grita. Atrás do bruxo, centenas, não,
milhares de sapos, todos de prontidão, imóveis, com os papos insuflados.
...Maicon Tenfen |
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